São 19h30 de uma quinta-feira no Rio, e cerca de 800 mulheres se espremem em um salão dentro de um clube em Copacabana, na Zona Sul do Rio, onde fica a sede da Igreja Celular Internacional. De vestido de bolinhas e salto alto, Sarah Sheeva, 39 anos, sobe ao palco. “Estamos aqui contra o espírito da cachorrice. Somos as princesas de Deus. Amém”, diz ela, seguida pelo coro da multidão. “Vamos gritar mais que show de rock!”, empolga-se a pastora, filha da cantora Baby do Brasil. É o culto das princesas, que acontece sempre na última quinta do mês.
“Se você é mulher e só aparece cachorro safado na sua vida, vem para cá que vai atrair homem honrado. Glória a Deus, Senhor”, entoa Sarah, que se tornou evangélica em 1997. De discípula, virou pastora, e passou a ministrar congressos de santificação Brasil afora. Há pouco mais de um ano, começou a escrever um livro, “Manual de princesices - Como deixar de ser cachorra, se tornar uma princesa, e receber o amor que você merece”, que será lançado ainda este ano.
“Percebi que no meio evangélico havia uma carência no que dizia respeito a ensinamentos para as mulheres”, conta. “Como o livro ainda não estava pronto, decidi fazer as reuniões. Na primeira, esperava umas 10 mulheres, mas apareceram 100. Na segunda, vieram 300. Começou a vir tanta gente que tivemos que abrir inscrições”, lembra ela. “Agora sonho em fazer no Theatro Municipal”, suspira.
Nas reuniões, há de adolescentes a mulheres na faixa de 50 anos, e homem não entra. No dia em que o EGO esteve lá, Pedro Bial e sua equipe faziam uma reportagem para o programa “Na Moral”, mas até o jornalista teve que deixar o salão após os cantos de louvor que dão início ao culto. “Elas ficam constrangidas”, explica Sarah, que ensina as mulheres a “se valorizar e não aceitar migalha emocional”.
Sem sexo e beijo na boca
Princesa que se preze não chega junto, mas espera o homem certo chegar. “Temos um tesouro no meio das pernas. O fato de ter uma vagina faz de você o ser mais precioso da Terra”, diz Sarah durante o culto. Quem segue os ensinamentos da pastora também não usa roupa sexy. “Mulher que usa decote não bota limite. Damos limites na nossa própria veste. Por que as prostitutas se vestem daquela forma? Aprenda a ter sensatez, a botar mistério nas suas vestes”, enfatiza ela, já julgando a camiseta regata que a repórter estava usando. “Dá para ver o ‘reguinho’ do seu seio, não pode”.
Sexo e beijo na boca são delícias apenas para o casamento. Se o príncipe ainda não apareceu, espere na seca. “A vontade da carne é igual a vontade de comer empada quando se está de dieta”, compara Sarah, há 10 anos sem sexo e há nove sem beijar na boca. Para não cair em tentação, ela evita filmes de romance, entre outras coisas. “É desafiador, mas não provoco desejo. Oro e me cuido”, diz. “Se Deus não me casou, é porque ainda não quis”, conta a pastora, que não admite nem ela mesma se dar prazer. “Não me masturbo”, afirma. “E também não tenho vergonha de dizer que estou há 10 anos sem ver um homem nu. Já fui ninfomaníaca, viciada em homem. Eu era uma ex-cachorra, sei o que é aceitar migalha emocional. Mas você aprende o que está errado e conserta”.
A parte final do culto é dedicada às perguntas das princesas. A maioria acaba sendo justamente sobre sexo. “Se você é casada, a Bíblia fala que não se pode privar o outro do seu corpo. Se você gosta e ele também, não tem problema. Eu, por exemplo, adoro um sovaco cabeludo”, brinca Sarah. Quase metade das perguntas é sobre sexo anal. “Deus criou cheiro para dizer o que presta e o que não presta. Por que as fezes fedem? É um orifício de saída, e não de entrada”, responde Sarah.
Depois das perguntas, ela canta enquanto assistentes passam para pegar os envelopes com as doações das princesas. “Jesus falou comigo: ‘não cobra’. Faço esse trabalho por amor. Luto para ajudar as mulheres. Mas a igreja oferece o espaço, e têm contas de luz e água para pagar”, justifica Sarah. “Se você quer adorar materialmente, não só na palavra, vou orar por você nesta parte financeira”, diz a pastora às fiéis. “Que venham sobre elas 10 vezes mais do que estão botando nos envelopes”, continua.
Ao fim do culto, depois de quase três horas, Sarah recebe as princesas para autografar seus dois livros, “Onde foi que eu errei?” e “Defraudação emocional”, à venda durante as reuniões. “Cuidado com o que você vai escrever. Fora de contexto as pessoas não entendem, acham que é coisa de maluco”, diz ela à repórter. “Mas não ligo para os julgamentos. Quando não sentia essa paz, ninguém me chamava de maluca”.