Guiné Equatorial, na África central, é governada com mão de ferro há 34 anos e movida a petróleo e "fanta" --como é conhecida a propina
FERNANDA ODILLA
ENVIADA ESPECIAL A MALABO (GUINÉ EQUATORIAL)
O mais longevo presidente africano é um ditador que faz obras por toda Guiné Equatorial, até mesmo na selva.
Com a participação de empreiteiras brasileiras, Teodoro Obiang, no poder desde 1979, está erguendo a nova sede administrativa do país praticamente no meio do nada, na parte continental da Guiné Equatorial, ex-colônia espanhola que também ocupa uma ilha cercada por petróleo onde está a atual capital, Malabo.
As empresas mineiras ARG e Andrade Gutierrez, por meio do braço português Zagore, já estão na selva abrindo rodovias e construindo o aeroporto, respectivamente. A Queiroz Galvão cuida da parte de saneamento e a Odebrecht disputa uma obra na parte continental do país.
A OAS está de olho nas obras em Oyala, cidade que abrigará a nova sede administrativa. Estão quase prontos a biblioteca da nova Universidade Internacional da África Central, um hotel de luxo e um campo de golfe.
EXTRAVAGÂNCIAS
Essa é apenas uma das extravagâncias de Obiang, colecionador de acusações diversas, como tortura, censura e lavagem de dinheiro, feitas por organizações internacionais. Ele nega, mas contratou consultoria norte-americana para melhorar a própria imagem mundo afora.
O governo Obiang, contudo, ganhou fama por ser uma cleptocracia. No país, "fanta" é sinônimo de propina e é rotineiramente pedida para saciar policiais fortemente armados que protegem prédios públicos, fazem barricadas em rodovias e estão sempre dispostos a revistar civis.
O ditador administra um país ainda carente de infraestrutura e repleto de desigualdade social, mas com cofres turbinados pelos dividendos do petróleo e gás, explorados desde o final dos anos 1990.
Os efeitos da exploração do petróleo são visíveis em especial na atual capital, Malabo. Cheia de plataformas de petróleo e ruas recém asfaltadas, a cidade é uma terra de contrastes, onde há, ao mesmo tempo, condomínios luxuosos, obras espalhadas por todos os lados, esgoto ao céu aberto e pessoas carregando toneis de água na cabeça.
Apesar de contar com indicadores sociais pífios, o petróleo fez disparar o PIB.
Um dos que desembarcaram em Malabo em busca de dinheiro é o espanhol Sérgio Obama, 29. Ele diz ter feito o caminho contrário dos pais, africanos que migraram para a Europa, disposto a fugir da crise e lucrar com petróleo.
"Com o dinheiro que esse país tem, não deveria ter tanta gente passando fome", diz.
No volante do táxi caindo aos pedaços, que funciona como transporte coletivo, Obama faz questão de mostrar o conjunto residencial onde mora.
O Buena Esperanza, com casas populares novinhas, é mais uma obra atribuída à benevolência de Obiang e sua primeira dama, Constancia Mangue, conhecida na cidade por ser dona de palacete, supermercado e até churrascaria com garçons e cozinheiros brasileiros em Malabo.
Ninguém sabe se o ditador, onipresente em cartazes e fotos por toda Malabo, é querido ou apenas temido."Prefiro esse presidente. Ele já está com o bolso cheio, agora pode pensar nas pessoas", alega Obama.
LULA
O país em construção não atraiu apenas aventureiros, mas também empresários brasileiros amparados pelo lobby do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, durante sua gestão, se aproximou da Guiné Equatorial.
"A relação de amizade que o Lula desenvolveu com o país, com Obiang, nos ajudou muito", afirma André Crusius, superintendente-geral da ARG, primeira empreiteira brasileira a tocar obras lá.
O país é visto pelos brasileiros como uma terra de oportunidades por ter dinheiro em caixa, menos de 1 milhão de habitantes e muitas obras a serem feitas. "É um país em construção. Estamos fazendo uma aposta grande na Guiné Equatorial", diz Augusto César Uzeda, diretor da área internacional da OAS.
O governo Obiang exige das empresas brasileiras a contratação de mão de obra local que, segundo os empresários, não é suficiente. Além de brasileiros, as empreiteiras levam paraguaios e bolivianos para tocarem as obras.
De acordo com a embaixadora do Brasil na Guiné Equatorial, Eliana da Costa e Silva Puglia, o país tem atraído muitos chineses que também atuam pesado na construção civil na ilha e no continente.
A embaixadora explica que governo local já é itinerante, despachando na parte insular ou na continental a depender da época do ano. Mas a principal justificativa para migrar para o continente é a necessidade de proteger esse e futuros governos.
A preocupação se justifica: ele assumiu o comando depois de dar um golpe no próprio tio. Desde então, já houve tentativas de derrubá-lo do poder.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/108355-ilha-do-medo.shtml