Preparem-se para o biggest Wall of text que já fiz em toda a minha história:
Adoro automobilismo, acompanho e tento ler o máximo possível sobre o assunto. Só pra se ter uma idéia, assisto a todos os GP's de F1 e Indy, tenho tentado acompanhar ao vivo a Nascar e até as 24h de Daytona eu passei algum tempo assistindo este ano.
Não sou fã do Senna. Respeito quem o tem como herói, considero muito legal o fato de ele ser fonte de inspiração para muita gente. Garra, vontade de ganhar, determinação, realmente, um cara vencedor. Piloto extraordinário, muito rápido. Falar bem do Senna é fácil, todos conhecem suas várias e várias qualidades que são ressaltadas e disseminadas no mundo todo.
Difícil é falar sobre as falhas, os defeitos que ele tinha. Não acho bacana entrar nas questões relacionadas à vida pessoal, como o relacionamento estranho que ele teve com a Xuxa ou o fato de ele passar um longo tempo sem sequer conversar com o Reginaldo Leme porque alguém numa mesa de jantar disse que o Senna era homossexual e o Reginaldo, que estava na mesa, não interferiu.
Vamos falar sobre as corridas, sobre o piloto Ayrton Senna. Sim, o Senna tinha defeitos!
Bom, o primeiro mito a ser quebrado é o das "manhãs de domingo". Muita gente fala "lembro até hoje, todo domingo de manhã era aquela festa para ver o Senna." Pois bem. Nas 10 temporadas completas que o Senna disputou, ele venceu corridas que aconteceram aos domingos de manhã apenas 26 vezes. Isso dá 6 meses, espalhados em dez anos. Vitórias nos EUA, na Austrália, aconteceram à tarde ou de madrugada. Mas longe disso ser um problema, o que vale realmente é a memória de todos e a mensagem de união e de família que o evento proporcionava. Numa análise fria, entretanto, as manhãs de domingo não foram tão numerosas assim.
Outro fator muito interessante é o fator ético, porque aí as comparações com o Schumacher são inevitáveis. Muito se comenta sobre as batidas intencionais do alemão sobre Damon Hill em 1994 e sobre Jacques Villeneuve em 1997. Poucos são os que comentam a batida intencional que Senna deu em Prost em 1990. Ele chegou a declarar em entrevistas, em tom obviamente cínico, que teria se confundido entre o freio e o acelerador. Bom o fato é que das três batidas citadas nesse parágrafo só a de Senna demonstra ter sido premeditada, pensada antes mesmo da corrida começar. Schumacher foi desclassificado do campeonato de 1997, Senna foi campeão. Claro, Senna era nitidamente perseguido pelo Balestre (chefão da FIA) na época, mas será que isso justifica bater no adversário de propósito?
Vamos para o comportamento do piloto dentro da equipe. Senna era famoso por sua força mental, sua vontade de destruir os adversários, especialmente Prost. O que nem sempre é considerado, nem lembrado, e que a força de vontade do brasileiro muitas vezes superava o limite da ética. O francês o acusou publicamente de descumprir um acordo de cavalheiros feito nos boxes. Em 1986, Senna, que já era considerado uma estrela em ascensão na Lotus, vetou a contratação de Derek Warwick. Em 1993, na sua sexta temporada com a McLaren, Senna não fechou contrato com a equipe que lhe ajudou a conquistar 3 títulos. Fazia um contrato por corrida, recebendo segundo especulações da época cerca de um milhão de dólares por corrida. Mesmo assim, insatisfeito com o carro e o fraco motor Ford declarou por diversas vezes que correria de graça pela Williams. Se a comparação novamente é com Schumacher, é interessante lembrar que Senna entrou na McLaren no melhor momento da história da equipe, e saiu durante um declínio que durou vários anos. Schumacher foi para a Ferrari em 1996 com a equipe em situação catastrófica, e a deixou em 2006 depois de 5 títulos (6 de construtores) e brigando pelo campeonato até a última corrida.
Agora, vamos ao que interessa: desempenho em pista. Senna era inegavelmente rápido. Muito rápido. Em classificação, e só. Ao mesmo tempo em que Senna era o rei das Poles Positions, com 65, Senna somente teve a volta mais rápidas de uma corrida 19 vezes. Para se ter uma idéia, Senna é apenas o 12º melhor piloto nessa estatística, atrás de Piquet, Berger, Hakkinen, Raikkonen e obviamente, Prost e Schumacher. Se Schumacher só superou o número de poles de Senna depois de disputar um número bem maior de GP's (Schumacher tem 68), o alemão registra nada mais nada menos que 76 vezes a volta mais rápidas em corrida. Isso é 4 vezes mais do que o brasileiro. Schumacher teve a volta mais rápida em 26,12% das corridas que disputou, contra 11,8% de Senna.
Ayrton era inconstante em corridas, apesar de muito combativo. Já bateu sozinho quando liderava com folga em Detroit e Mônaco (episódio famoso onde ele saiu do carro e foi direto para a casa dele antes de ir aos boxes). Senna já bateu o carro, saindo da prova, ao se envolver em disputa com Nigel Mansell, na época na Ferrari, em um GP no México. O interessante é que Mansell já havia sido desclassificado da corrida várias voltas antes.
Enfim, Senna ganhava poucas corridas se observarmos a quantidade de voltas lideradas comparativamente com o número de vitórias, o que corrobora para estabelecê-lo como rápido, porém inconstante. Senna liderou 2931 voltas e ganhou 41 corridas, enquanto Prost liderou 2683 e ganhou 51. Schumacher liderou 5111 voltas e ganhou 91 corridas. Se ganhar mais uma corrida, Schumacher empata com Senna e Prost somados.
Concluindo, Senna pra mim foi um piloto extraordinário, mas não o melhor do mundo (Schumacher e Fangio o superam, na minha opinião). Respeito muito seus feitos e considero muito importante o fato dele ser tratado como um herói nacional, apesar de considerar que o Pelé também deveria ter tratamento semelhante.
O bom, e o mais importante, é o fato dele inspirar muita gente, e fazer o Brasil ser mais lembrado e respeitado lá fora.